Top 50 da CENA – A graça da Gracinha. O futuro do pretérito do Thalin. E a (o) dinamite do Antônio Neves, a melhor coisa do Vasco nos últimos tempos

É, demoramos nesta semana. Mas foi por capricho, viu? Fomos em Natal buscar este primeiro lugar precioso e ainda pouco ouvido. Ainda desbravando o Brasil, quase viramos vascaínos (apesar dos pesares e do Flamengo), viramos fã da Maria Esmeralda mesmo ela não existindo, choramos com Hermeto, vamos na vibe com o FBC e rebolamos com Carlos do Complexo. Não dá pra reclamar de mesmice por aqui.

Vocês sabem que a gente meio que sonha que o rock brasileiro novíssimo volte a tocar nas rádios, né? Seria lindo se isso rolasse com o dream pop gracioso de Gracinha. Nascida na Baixada Fluminense e criada pelos pais adotivos em Natal, no Rio Grande do Norte, Isabela Graça é daquelas que fez da música sua melhor amiga muito cedo. Fez parte de banda espírita, de banda punk e estreia agora solo com “Corpo Celeste” – que coloca um pezinho no indie e um pezinho num jeito popular de se fazer rock que se perdeu em algum momento da virada ali nos anos 2000. Mais fácil te sugerir o play do que explicar, mas a gente não sente algo parecido assim desde Pitty, talvez. Gracinha pensou no título comparando a imensidão e solidão de planetas, constelações e galáxias com a nossa própria imensidão e solidão. “Solidão e presença”, diz. “As composições parte de um lugar meu como mulher negra e lésbica e minha relação com a solidão e o preterimento”, escreve a compositora e baixista. Daqui a gente acha que é questão de tempo para muito dessa solidão ser passageira. Gracinha tem tudo para conquistar uns milhares ou milhões de fãs. Avisamos antes.

Em seu terceiro lançamento do ano, o rapper-baterista-artista paulistano Thalin (Os Fonsecas e Dupla 02) se uniu a Cravinhos, Pirlo, iloveyoulangelo e VCR Slim para contar a história da vida do eu-lírico imaginário Maria Esmeralda em versos e beats, uma espécie de união em disco do passado e do futuro da música brasileira. Com a faixa “Todo Tempo do Mundo” temos um exemplo de composição e arranjo que traz a MPB clássica da época de Maria Medalha, figura chave na cena dos anos 1960/70, com as referências atuais de rap, jazz do produtor, intérprete e compositor do álbum e seus quatro parceiros têm acesso. A música consegue abordar temas e evocar esses sentimentos confusos que permeiam uma história de vida. Conceito raro. Resultado beeeem interessante.

A vez é de Antônio Neves e seu trombone, trompete e voz, sempre carregada de bom humor. “Há quem me chame de pessimista, Mas, não, eu sou vascaíno.” É assim que começa “Deixa com a Gente”, seu novo álbum. E, pô, não é todo dia que um disco abre com um gol invalidado pelo bandeira – deve ser o primeiro da história. Mas tudo se resolve no samba com um gol de Roberto Dinamite e uma belíssima homenagem a cruzmaltinos ilustres: Tereza Cristina, Paulinho da Viola, Martinho da Vila, Aldir Blanc, Aracy de Almeida, Clementina de Jesus, Pixinguinha, Zé Keti e Nelson Cavaquinho. Onde encomenda uma camisa do gigante?  

É capaz que muita gente não se aproxime da música de Hermeto Pascoal com medo de encarar uma obra hermética. Hermeto pode ser em algum momentos difícil, experimental e cabeçudo demais, mas nunca entrega algo sem alma. “Pra Você, Ilza”, então, é puro coração – um álbum dedicado a sua companheira de vida Dona Ilza, que morreu em 2000. Perto dessa época, Hermeto escreveu um livro de músicas para ela – do material, o produtor Fábio Pascoal e Hermeto tiraram as composições, naturalmente modificadas na hora de serem encaradas no estúdio. Músicas de paixão eterna.

Em “NTGM”, álbum que Carlos do Complexo lançou no ano passado, “Sextos Sentidos” era uma parceria dele com Bebé que soava sensível e sexy. Agora, no EP de remixes de outros artistas para obras de Carlos, a faixa virou uma putaria só. A edição que fizeram com a voz de Bebé deixando o seu refrão original todo recortado é brilhante. Cuidado que esta música vicia.

Com uma capa superchic, meio Hélio Oiticica, feita por Ana Frango Elétrico e Maria Cau Lev, FBC faz um rap resumo dos últimos anos, período em que mais bombou e viu muita coisa rolar. Como este sucesso que aconteceu quando ele meio que se afastou do rap _ ainda que não muito. É interessante se reapresentar em algo mais “tradicional”.

Ah, os mineiros. Sempre talentosos em diversos gêneros musicais. Rap, funk, música eletrônica. Não tem erro. A onda da dupla Paira, de BH, formada por André Pádua e Clara Borges, é outra. Na real, são muitas ondas: drum’n’bass, noise, dream pop. “O Fio”, segundo single da duplinha, é cheio de momentos bem diferentes em si. São pouco mais de três minutos, mas parece que rolaram uns quatro ou cinco músicas. Para ficar de olho.

É legal que Melly tenha chamado seu primeiro disco de “Coletânea pra quem sente, e sente muito. Pra quem se permite sentir”. Coletânea é uma palavra apropriada para “Amaríssima”, seu mais recente lançamento. O álbum parece mesmo uma coleção de hits. Que momento que vive esse mix de R&B e neo-soul no Brasil. E já temos um sucesso desse discão da Melly: a quente “Bandida”.

O nome da banda é inusitado. O que eles defendem é mais ainda: a criação de um relativo para o midwest emo, um tal de emo caipira. Não gostou do que leu? Oh, dá uma chance, viu? O som deles é bem bom. E é difícil não cair no humor afiado do quarteto de Santa Bárbara d’Oeste, interior de São Paulo, no decentíssimo disco que é “Siamês”, o recém-lançado álbum de estreia deles. Dá para até para dizer que temos uma cena do emo caipira: Chão de Taco, Quem É Você Alice?, Bella e o Olmo da Bruxa, Meu Inverno Preferido e até o conhecidinho Eliminadorzinho. Se a Trama Virtual, principal alavanca da primeira onda emo brasileira, ainda estivesse de pé, vocês iam ver só onde a Chococorn ia parar!

Semana passada destacamos por aqui o quanto Edgar encontrou um retorno ao início em “Universidade Favela”, seu sétimo trabalho, gravado após o compositor voltar a morar na Favela do Coqueiro, em Guarulhos, durante a pandemia. Nesta semana, a gente destaca outra favorita nossa deste discão recém-lançado: a absurda “Incapturável”, que reúne Edgar com Os Fita, formado pelos produtores Abel Duarte e Cainã Bomilcar, famosos pela parceria com o gênio Tantão. A letra em português com algumas estrofes em inglês tem tantas camadas e sacadas que é difícil pinçar uma. Fique com: “Porque um vulcão/ Em erupção/ Eu vejo todo dia lá na minha quebrada/ Igual o violinista do Titanic/ Até o Brad Pitt/ Tem bad trip”. Tá?

11 – Silva – “Abram Alas” (5)
12 – Bebé – “Recado Dado (com Dinho Almeida)” (6)
13 – Max B.O – “Impossível Não Achar Possível” (7)
14 – Marcelo Jeneci – “Um Sonhador” (8)
15 – Milton Nascimento + Esperanza Spalding – “Outubro” (9)
16 – Flora – “Eu Tenho Sal” (10)
17 – Planet Hemp – “Jardineiro” (11)
18 – João Bosco – “E aí?” (12)
19 – Pluma – “Corrida!” (13)
20 – Mateus Fazeno Rock – “Madrugada” (14)
21 – Moreno Veloso – “A Donzela Se Casou (com Maria Bethânia, Caetano Veloso, Tom Veloso e Zeca Veloso)” (15)
22 – Barro – “Vira-lata Caramelo” (16)
23 – Duquesa – “Milionário e José Rico” (17)
24 – Julia Branco – “Baby Blue” (18)
25 – Don L – “Bem Alto” (19)
26 – Flora Matos – “Inventei o Seu Jeito de Amar” (20)
27 – Anitta – “Grip” (21)
28 – Céu – “Cremosa” (22)
29 – Luiza Brina – “Oração 2 (com Silvana Estrada)” (23)
30 – O Grilo – “Manual Prático do Tédio” (24)
31 – Duda Beat – “q prazer” (25)
32 – Cátia de França – “Fênix” (26)
33 – Papisa – “Fronteira” (27)
34 – Varanda – “Vá e Não Volte” (28)
35 – Taxidermia – “Clarão Azul” (29)
36 – Mirela Hazin – “Delírio” (30)
37 – Bruno Berle – “Te Amar Eterno” (31)
38 – Fresno – “Quando o Pesadelo Acabar” (32)
39 – Pabllo Vittar – “Pra Te Esquecer” (33)
40 – Tuyo – “Devagar” (34)
41 – Irmãs de Pau – “Megatron” (35)
42 – Haroldo Bontempo – “Risada (com João Donato)” (37)
43 – Jota Ghetto – “Michael B. Jordan na Fila do CAT” (38)
44 – Deize Tigrona – “25 de Abril (com Boogarins)” (39)
45 – Jujuliete –  “Dominatrix” (40)
46 – Apeles – “In God’s Hands” (41)
47 – Amaro Freitas – “Viva Naná” (42)
48 – Sofia Freire – “Autofagia” (43)
49 – Kamau – “Documentário” (44)
50 – Madre – “Sirenes” (47)


***
* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, a cantora Gracinha, de Natal.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.

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