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* O inglês George Ezra completou 25 anos dois dias antes de desembarcar em São Paulo para o seu primeiro show no Brasil e, no encontro que teve com a Popload na véspera do evento, abriu a conversa assumindo que não é lá muito fã de aniversários: “Aproveitei um tempo com minha família, fomos ao boliche e assim é o meu tipo de aniversário perfeito: perto deles e dos amigos. No dia seguinte, já estava na estrada novamente. Essa viagem ao Brasil não deixa de ser um presente e parte da festa também”.
Motivos para comemorar em grande estilo ele teria de sobra: Ezra está na turma que movimenta o novo pop britânico com números estrondosos, a exemplo dos conterrâneos Ed Sheeran e Sam Smith. Misturando rock, folk, blues, elementos do gospel, muitas palminhas e uma leve inclinação para o country, ele rodou o mundo tocando em todos os grandes festivais de música que você pode imaginar. Seu álbum de estreia em 2014 foi o mais vendido do Reino Unido e em dezenas de países naquele ano, o que se repete agora com “Staying at Tamara’s”, lançado em março. E ainda arranja tempo para gravar um podcast com colegas como Elton John e Lily Allen, escrever um newsletter semanal para os fãs e atualizar uma playlist incrível com tudo o que tem escutado.
Confira abaixo o papo na íntegra e saiba como foi o festival da Cultura Inglesa no final do post.
Popload: Você acaba de fazer 25 anos. Quais são os desafios e aprendizados em ficar mais velho?
George Ezra: (Risos) Uau, melhor não pensar muito sobre isso. Acho que estou no vácuo que existe entre o adolescente e o adulto. Não me vejo como nenhum deles, entende? É estranho pensar nisso, é um processo de transição. Faço música desde os 13 anos e um belo dia simplesmente aconteceu: estava em estúdio, no palco, vivendo de música. Crescer é muito prazeroso, especialmente se você pode se dedicar a fazer o que ama. Tenho certeza que é só o começo de uma longa jornada pela frente.
Popload: Essa experiência na estrada, em quase quatro anos seguidos de shows, mudou de alguma forma o seu retorno ao estúdio e o processo de gravação do novo álbum?
Ezra: Totalmente! Diria que muito do estilo do novo álbum vem da minha vivência dos shows, pois, desde que comecei a fazer turnês, pude tocar para todos os tamanhos de público que você pode imaginar, de 1.000 a 100.000 pessoas. Acabei aprendendo como me conectar ao público. O feedback é instantâneo. Por exemplo: no primeiro álbum, apenas duas ou três músicas tinham backing vocals. Era algo mais voz e violão. Depois de fazer tantos shows, percebi que era hora de algo mais poderoso e o “Staying at Tamara’s” saiu com essa pegada mais gospel, músicas encorpadas e com mais camadas, com refrães feitos para todo mundo cantar junto em um festival ou casa de shows. É um reflexo de tanto tempo na estrada e da experiência do ao vivo. É um álbum mais solar, animado, estou muito feliz com o resultado.
Popload: Com uma agenda tão apertada, de onde tirou tempo para lançar o podcast “George Ezra & Friends”? Quem é o convidado que está no topo da sua lista de desejos? (George tem um podcast semanal onde conversa com outros músicos que admira, entre eles o amigo Ed Sheeran, Ben Tchatcher do Royal Blood e Sir Elton John.)
Ezra: A verdade é que começou como um hobby. Houve uma época em que comecei a ouvir muitos podcasts de comediantes e eram realmente fascinantes e divertidos, mas ainda sentia falta de algo específico sobre música. Também suspeito que tenho um lado radialista adormecido, que espero explorar cada vez mais. Comprei um microfone, mandei alguns e-mails para esses artistas incríveis e assim começou. Acho saudável que um artista tenha projetos paralelos, é importante para manter-se sempre motivado e criativo. E definitivamente qualquer membro dos Rolling Stones está no topo da minha wishlist de convidados. Espero que eles leiam esta entrevista (risos).
Popload: Você vai tocar em um festival que promove a música britânica. Quais artistas do seu país, um grande clássico e uma novidade, que você mais gosta e recomendaria para seu público e fãs de música em geral?
Ezra: Por que a última pergunta é a mais difícil? Preciso de tanto tempo para responder isso! Acho que a Inglaterra, no geral, é muito fã dos clássicos. Seria complicado escolher entre os Beatles e os Rolling Stones. Tem que ser um deles? Posso escolher os dois?
Popload: Com certeza!
Ezra: Ufa, obrigado! Então Beatles e Stones são os meus clássicos favoritos. E um artista novo, pode anotar: Ten Tonnes. Comece pela música “Lucy” e você vai amar de primeira!
Obs.: Somente no fechamento deste post, descobrimos que o tal Ten Tonnes é irmão mais novo do cantor e vale mesmo o play. George Ezra é definitivamente um homem de família.
Talvez a grande força de um festival de música está em promover artistas que se completem nas semelhanças e principalmente nas diferenças, oferecendo para um público que tende a ser diverso (se você não está num evento de heavy metal, claro) uma experiência tão diversa, rica e interessante como a própria música em essência o é.
O Popload Festival já promoveu coisa do tipo em 2015, quando lado a lado (ou acima e abaixo) foram escalados o mito punk americano Iggy Pop e o rapper paulistano Emicida.
E, de novo, o que levou quase 20.000 pessoas ao Memorial da América Latina, em SP, foi muito além de um nome específico no line-up ou a gratuidade dos ingressos do Cultura Inglesa Festival.
Definitivamente foi o todo. Junte um britânico cheio de hits “fofolks” em seu primeiro e único show na América Latina e uma talentosa cantora carioca na árdua escalada ao panteão pop brasileiro.
À primeira vista fica difícil entender as conexões, mas George Ezra e Iza, ambos com 20 e poucos anos e headliners do evento, provaram na 22ª edição do CIF que os diferentes gêneros musicais estão aí para serem misturados mesmo e que existe palco e plateia para todos.
O público assistiu a dois shows antagônicos, mas igualmente marcantes. De um lado, Ezra e uma superbanda com instrumentos de sopro, muitas trocas de guitarras e movimentação contida, mas mesmo assim emocionada diante de tanta gente. A voz de baixo-barítono do cantor preencheu o Memorial de “Cassy O”, que abriu o show com a energia e o impacto certos, ao hit “Budapest”, devidamente acompanhado a plenos pulmões pelo público. As músicas do novo álbum são ainda melhores ao vivo e se fazem necessárias para reaquecer a plateia depois dos momentos de voz, violão e pouca luz.
Já Iza levou um show mais pop e acessível e tudo o que isso envolve: DJ, backing vocals, dançarinos, figurinos e muito papo com a plateia. Com apenas um álbum nas costas, a cantora estruturou um setlist eficiente sem cometer o erro da repetição ou covers excessivos, um mal recorrente de quem tem pouco repertório próprio. A única exceção, com razão, foi sua música em parceria com Marcelo Falcão d’O Rappa, tocada duas vezes e que, como o próprio título diz, comprova que Iza e sua turma são realmente do bonde “Pesadão” do novo pop brasileiro.
Tradicionalmente mais rock, com performances históricas de nomes como Franz Ferdinand, Johnny Marr e Kaiser Chiefs, as últimas edições do Cultura Inglesa têm ampliado a participação de artistas mais radiofônicos e apelo pop, a exemplo de Charli XCX, Karol Conka e os headliners deste ano.
O festival encontrou seu lugar no Memorial da América Latina e entrega tudo o que é preciso para aproveitar um evento desse porte. A verdade é que já não importa mais quem ocupa o seu palco: promover um choque de cultura geral, unindo pela música crianças (muitas delas em sua primeira experiência de festival), famílias inteiras e grupos de amigos tão diversos como o lineup é a maior das missões.
** A foto de Ezra que ilustra a chamada da home para este post é de Camila Picolo. Todas as imagens do post são de Maria Tuca Fanchin.
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