Top 50 da CENA – Bruno Berle, Fresno, Pabllo Vittar e o melhor da nova música brasileira

E tome textão! Se a cena estrangeira foi movimentada nesta semana, a brasileira fez igualzinho e complicou nossa vida de ouvinte/analista. Discões foram lançados e precisamos canetar muito e com atenção redobrada! São trabalhos que mexeram com a gente. Só ver o volume de texto dedicado às novidades de Bruno Berle, Fresno e Pabllo Vittar. Todos na mesma prateleira A gente até pede desculpa se ficou devendo algo sobre outros lançamentos. Vamos dar conta de tudo até o fim do ano [risos nervosos].

“No Reino dos Afetos 2”, novo disco do alagoano Bruno Berle, não é uma mera continuação de “No Reino dos Afetos”, sua estreia. O número dois aí tem outra função. Não é repeteco, é Bruno adentrando de um novo lugar físico, mental e profissional o modo “No Reino Dos Afetos” de pensar sua música. Dentro da metáfora do cinema, seria não fazer a sequência, mas a partir das mesmas premissas que guiaram o primeiro filme fazer um novo longa. O roteiro é outro, os atores são outros, a fotografia é outra, permanece a intenção. Confuso? Tudo bem. É mais fácil dar o play e ficar emocionado já nas primeiras notas e palavras de “No Reino dos Afetos 2”. O novo trabalho reflete muito a chegada do artista no Sudeste, suas novas percepções sobre a carreira e sobre a vida. Bruno não ficou livre de dolorosas questões, que faz questão de compartilhar e enfrentar, como o notório racismo que permeia a indústria musical brasileira, mas se presenteou com boas amizades, encontrou uma turma que imagina o futuro também ao seu novo modo. Bebé, BatataBoy, Dadá Joãozinho são nomes que vêm à mente. É desse lugar bacana que ele despeja e encontra as melodias e letras mais emocionantes e certeiras de sua carreira. 

Desde o profético “Sua Alegria Foi Cancelada”, lançado em 2019, a Fresno parece ser a banda brasileira que mais sabe traduzir uma geração toda – que vai de uma turma muito jovem até os emos mais velhinhos ali quase beirando os 40, talvez. Pense que são das poucas bandas brasileiras de rock que já circularam pelo mainstream que tiveram a decência de criticar abertamente o bolsonarismo. Nesse meio tempo, fizeram seus melhores discos: o disruptivo álbum de 2019, a boa continuação mais pop “Vou Ter Que Me Virar” em 2021 e o novíssimo “Eu Nunca Fui Embora”, que teve até agora só sua primeira parte divulgada. Encarando esses discos como uma trilogia, “Vou Ter Que Me Virar” parece não só amarrar o período recente como ser um acerto de contas com o passado da banda – a sonoridade é mais emo clássica aqui, o que indica um retorno ao passado, mas a maturidade das letras seguiu adiante, o que leva a um olhar de futuro. As dores de amor da letra nunca foram tão complexas. E não andam sozinhas, até porque podem ser vividas por casais felizes, como é o caso de Lucas Silveira e Karen Jonz, que dessa aparece pelo disco como fiel parceira também na divisão das composições – as melhores do disco, diga-se. “Quando o Pesadelo Acabar” é desses exemplares de canetada em dupla. Numa primeira leitura, pode ser entendida como uma mera descrição de alguém durante um pesadelo. Dando um passo para trás dá para entender que eles não falam só de uma noite ruim de sono, mas de viver dentro do pesadelo político brasileiro – tanto que um trecho da música circulava antes das eleições de 2022. Uma sacada tão legal quanto os pequenos interlúdios que retomam melodias do passado, criando um filme mais denso na cabeça dos fãs atentos aos detalhes. A banda vendeu a história de que este é o disco do ano. Não sabemos, viu ? Estamos em abril, pera. Mas talvez seja o melhor que eles já fizeram, dá para dizer desde já.    

Quando Pabllo Vittar lançou o primeiro volume do “Batidão Tropical”, álbum onde mesclava inéditas e regravações de bandas de forró e tecnobrega em forma de hyperpop, rasgamos elogios aqui por duas razões: 1. lançar para o mundo um Brasil desconhecido até por muitos brasileiros por puro preconceito; 2. pensar a música pop global a partir da cultura do Brasil e não no sentido inverso, onde os nossos ritmos viram mero acessórios das tendências globais. É um lance tão quente que o lançamento posterior de Pabllo, o bom e divertido “Noitada”, não conseguiu repetir esse mesmo impacto transformador e/ou criar algo mais forte que isso. Dar o play em “Batidão Tropical Vol.2” é voltar a todos os elogios do primeiro volume, já que a ideia segue foda e zero repetitiva. Não tem cansaço. E basta ver o efeito – o volume de comentários e gente pirando com o disco já está absurdo. Pabllo conseguiu de novo.

A capa de “Paisagem”, novo álbum do trio paranaense Tuyo, é uma foto do mestre Walter Firmo. Na imagem, Lio, Lay e Jean correm por uma praia deserta, longe da câmera. Mas daqui dá para ver que eles estão pisando firme no presente. Em seu terceiro trabalho, descontando uma boa leva de EPs e singles, a banda parece completar o que foi ensaiado no disco anterior: uma ruptura com o modelo de seu início, mais formal, mais ao violão, de olho no que é possível ser reproduzido ao vivo em trio. Não há aqui uma ruptura com o modelo canção, mas como a forma de encarar até onde o estúdio pode levar cada registro – o que acaba por levar a estruturas mais soltinhas nas letras. Também não há medo em encontrar a sonoridade que cada faixa pediu. Algumas são mais experimentais, outras têm timbres oitentistas clássicos, há espaço até para um arranjo de cordas de Verocai. Esta “Devagar”, por exemplo, acena para um soft jersey club – dá para dançar ela no Tik Tok, saca? E, ainda assim, tudo é marcado por uma forte unidade. Discão.

O nome do álbum “Gambiarra Chic, Pt. 1” traduz o atual processo criativo de Isma Almeida e Vita Pereira, as Irmãs de Pau. A gambiarra foi escrever novas músicas com o pouco tempo do corre da estrada, cada vez mais agitada com o sucesso. Sucesso que promoveu a parte chic, já que o reconhecimento do trabalho anterior rendeu um pouco mais de conforto financeiro e mental – e também aumentou a farra, lógico.  Sente o pique em dois versos: “Um plug no meu rabo/ Silicone no meu peito”. É pra chegar chegando mesmo, dando novas facetas para o funk ostentação e espantando os caretas de Paris, New York. “Megatron” traduz um pouco desse agito todo – com direito a telefone de contato para shows, ops, e-mail de contato para shows no final da track, afinal o corre não pode parar. 

O quarteto paulistano O Grilo assustou seus fãs no Instagram com um trecho de música que anunciava o fim da banda. No fim, era só um verso que estará presente no próximo disco deles, “Tudo Acontece Agora (Pt.1) – sim, mais um álbum com lançamento dividido em duas partes. A banda não vai acabar, tem uma turnê enorme pela frente e aparece superotimista no primeiro single desta nova jornada, a bela “Seja Você Quem Quiser”.

Se “Baile” foi o álbum que fez FBC tocar em todos os celulares e festa do Brasil, a sequência ousada “O Amor, o Perdão e a Tecnologia Irão Nos Levar para Outro Planeta” consolidou o rapper mineiro com grande atração nas centenas de festivais pelo país. Boas músicas somadas ao carisma de Fabrício e a feliz transferência do que está no disco para o palco com uma superbanda não tinham como dar errado. E isso justifica a precoce versão ao vivo do trabalho gravado em uma apresentação em Belém – até porque, em tempos digitais, não existe mais aquele conceito de disco ao vivo preguiçoso. Seria até massa se tivesse mais e mais registros dos nossos artistas favoritos, uma coisa meio igual ao que Pearl Jam fez de lançar todos os shows. Sim, a gente se empolga, tudo bem.

Quando bolou a batida da bossa nova encafifado no banheiro é bem capaz que João Gilberto observava os próprios sapatos ou os pés descalços balançando ao ritmo da música. Natural que seu modo de sambar e tocar, muito inspirado também no violão de Dorival Caymmi e seus acordes marcantes, apareçam em forma de shoegaze nas mãos de Sonhos Tomam Conta, o nome do projeto da guitarrista paulistana Lua Viana em seu quarto álbum, “Corpos de Água”. Cada composição do disco parece tornar a conexão impossível entre os dois estilos em algo natural. Tipo água.

Organizado pela dupla Zegon e Tejo Damasceno, “Sabotage 50 anos” reúne sete releituras em homenagem ao rapper, unindo versos seus com participações de nomes de todas as gerações e ritmos diversos. Por exemplo, “Dama Tereza”, lançada em 2002 no disco “Coleção Nacional” do Instituto baseada em samba, virou um reggae com versos de Don e Luedji Luna. Classe demais.

As duas novas de Tom Zé são como faixas irmãs. Foi para Danilo Miranda, diretor do Sesc que morreu no ano passado, que Tom contou sua ideia de escrever sobre uma segunda vinda de Cristo em forma não de homem, mas de floresta. A seu modo, Tom entendeu de Danilo que não contasse a ideia até fazer a música. E foram três anos, atrapalhado pela pandemia, para que o baiano resolvesse a canção. Música forte e que termina em tom de alerta: “Se a gente não lutar/ Nem Cristo pode salvar”. Presente de Danilo, que é homenageado na segunda música, um samba que brinda a escuta atenta, o aprendiz que fez do Sesc a obra de arte que é.

11 – Luiza Brina – “Oração 18 (Pra Viver Junto)” (7)
12 – Malu Maria – “A Língua Trava” (8)
13 – Francisco, El Hombre – “O Que Existe É o Agora (com Lenine)” (9)
14 – Bruna Mendez, BRUNÊ e DeVito Cxrleone – “Eu Já Não Falo de Amor” (10)
15 – Noporn – “Preferia Nunca” (11)
16 – Haroldo Bontempo – “Risada (com João Donato)” (12)
17 – Tássia Reis – “Mais Que Refrão (com Rashid)” (13)
18 – Jota Ghetto – “Michael B. Jordan na Fila do CAT” (14)
19 – Deize Tigrona – “25 de Abril (com Boogarins)” (15)
20 – Jujuliete –  “Dominatrix” (16)
21 – Apeles – “In God’s Hands” (17)
22 – Jota.pê – “Quem é Juão” (18)
23 – Juçara Marçal e DJ Ramemes – “Ladra – Remix” (19)
25 – Amaro Freitas – “Viva Naná” (20)
25 – Sofia Freire – “Autofagia” (21)
26 – Papisa – “Amor Delírio (com Luiza Lian)” (22)
27 – Carne Doce – “Cererê” (23)
28 – Emicida – “Acabou, Mas Tem” (25)
29 – El Presidente – “Perigo no Sol (com Benke Ferraz)” (28)
30 – Kamau – “Documentário” (29)
31 – Josyara – “Ralé/Mimar Você” (30)
32 – BNegão – “Canto da Sereia” (32)
33 – Maria Maud – “02.02” (33)
34 – Madre – “Sirenes” (34)
35 – Ayrton Montarroyos – “Peter Gast” (35)
36 – Guerra – “É Massa” (36)
37 – Raidol – “Imensidão” (37)
38 – Rodrigo Campos – “Gamei” (38)
39 – Thami – “Deixa Queimar” (39)
40 – Jup do Bairro – “Amor de Carnaval” (40)
41 – Jorge Aragão com Rappin Hood – “Mafuá” (41)
42 – Chinaina – “Roubaram Minha Jóia” (42)
43 – Dead Fish – “11 de Setembro” (43)
44 – Vandal – Violah (44)
45 – Clara Bicho – “Luzes da Cidade” (45)
46 – Parteum – “’12 6 10” (46)
47 – Psirico – “Música do Carnaval” (47)
48 – GRIYÖ – “Afropenobeat” (48)
49 – Rico Dalasam – “Jovinho” (49)
50 – Ogoin & Linguini – “Quando Tudo Começou” (50)


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* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, ela, Pabllo Vittar.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.

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