Estamos aqui absorvendo os efeitos do festival. Será que os mais velhos sacaram que a Laufey, responsável por atrair milhares de adolescentes para seu show, lá na frente tem tudo para ser uma Lorde da vida? É, a neozelandesa também já foi levada menos a sério só por ser uma jovenzinha quando colou no Popload Festival em 2018. Acontece. Vamos acompanhar. As duas, aliás.
Quando a gente para pra pensar, “Man of the Year” é uma premiação tão tosca quanto “Miss Universo”. São marcos de um mundo caduco, de um passado e sua limitada visão sobre gênero, performance e padrão. Não é por acaso que Lorde apela aqui para uma frase pinçada de “Clube Da Luta”, filme que pretendia bater na masculinidade tóxica e acabou virando arma da cultura masculinista atual – “You met me at a really strange time in my life”. A ideia de romper com as barreiras de gênero veio para Lorde quando ela largou o anticoncepcional e voltou a ovular. Em suas palavras: “Parece loucura, mas senti que, de repente, eu estava fora do mapa da feminilidade. E acreditei totalmente que isso permitiu que as coisas se abrissem”. Essa liberdade durou até seu diagnóstico de transtorno disfórico pré-menstrual, daí Lorde começou a usar DIU – que aparece no raio-x da capa de “Virgin”, seu novo álbum. Tudo se conecta, não é? É o som do seu renascimento, como ela mesmo descreveu.
Escrevendo sobre amadurecer, na real sobre completar 33 anos, a incrível Adrianne Lenker dá o ponto pé inicial no que será o próximo álbum da bandaça nova-iorquina Big Thief. Seu trio com Buck Meek e James Krivchenia quebra um silêncio de três anos com o vindouro “Double Infinity”. Apesar do nome, o álbum não terá 20 faixas que nem o anterior. Uma pena.
Sempre com sua voz rouca e sua Gibson SG por perto, Nilüfer Yanya prepara o EP “Dancing Shoes”, uma pequena coletânea de músicas que quase fizeram parte do excelente “My Method Actor”, álbum lançado ano passado. A artista britânica conta ter finalizado elas só depois que a tour do disquinho acabou. Acontece. O interessante aqui é talvez elas funcionarem como uma ponte entre passado e futuro do seu trabalho. Pouca coisa mudou, mas alguma coisa aconteceu.
Uma das grandes bandas indies da Inglaterra agora, que tem escorrendo pela veia o pós-punk dos últimos anos, mas também algo mais rocker do estilo inglês mais antigo, de bandas como Waterboys e até Killing Joke. Esta inédita “The Rope” já aponta novos caminhos para o quarteto Wunderhorse, que em 2024 lançou o belo segundo álbum que ficou famosão no circuito independente, o “Midas”, a ponto de fazer o Wunderhorse abrir para os Fontaines DC.
Girl In Red, aka Marie Ulven, sempre fez o que chamamos por aqui de “indie mental health”. Diagnosticada com TOC, a norueguesa costumeiramente abriu a questão emocional com muita franqueza em suas canções. Novamente o assunto vem à tona em “Hemingway”, abordando sua depressão e alcoolismo, que teriam ficado sérios ano passado. Sóbria, ela não pega leve com si mesmo: “Você bebe como Hemingway, mas não escreve bem e suas músicas são todas iguais”. Apesar da dureza, é praticamente um “ano passado eu morri, mas neste ano eu não morro” dela.
“Cutthroat” pode ser entendido em inglês como assassino/degolador, mas também como desonestidade, trapaça. É pelos dois sentidos que o Shame se apropria dela no título de seu quarto álbum. “É sobre os covardes, cuzões e hipócritas”, adianta Charlie Steen quanto aos tópicos do novo disco. Mais? “É cru, primitivo. É a pessoa que apareceu na festa sem ser convidado”. Para a faixa-título, outra inspiração foram os paradoxos de Oscar Wilde. Algo na linha da citação usada por Susan Sontag em “Contra A Interpretação”: “Só quem é superficial não julga pelas aparências”.
Após produzir excelentes discos de nomes como Kurt Vile, Devendra Banhart, Wilco e Horsegirl, Cate Le Bon retomou sua carreira solo. “Michelangelo Dying” promete ser um disco doloroso daqueles. Se trata de um trabalho pós-término, dor no coração e tudo mais.
“GERM” é um acrónimo para “garota, excludente, regressiva e misógina”. É o termo cunhado por Kate Nash para criticar as feministas radicais transfóbicas e a decisão da Suprema Corte britânica de excluir as mulheres trans da definição legal de mulher. Sabe o papelão feito por nomes como J.K Rowling? Então. Kate, com toda razão, acha que o feminismo não tem nada a ver com isso e foi pra cima.
O vídeo da música, aparentemente feito com IA, vai render mais polêmica que a faixa em si, mas é boa a filosofada de Ruban Nielson por aqui. Acreditando em alguma bondade dentro de todos nós, mesmo aquela escondida lá no fundo de algumas pessoas, ele se questiona sobre o que teria levado subitamente boa parcela da humanidade em abdicar dessa mesma bondade. Trocando em míudos, quando teu tio virou um facho? Risos nervosos. Daí faz sentido ele apelar para IA para o vídeo. Nielson está levantando um debate, e a pergunta é: ficamos obsoletos? A faixa está no próximo EP da orquestra de um homem só, “Curse”.
Nem só de pó-punk e U2 vive a Irlanda. O The Altered Hours se encaixa mais entre algo que pode ser chamado de nova psicodelia ou shoegaze, depende do dia. Single do que será seu terceiro álbum, de uma longeva e curta discografia, a banda aponta para caminhos mais rústicos e secos. Chega a lembrar um pouco o alt country do Decemberists. O fato deles serem amiguinhos do Fontaines não influenciou a gente na escolha para o Top 10. Sério.
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* Na vinheta do Top 10, a cantora Lorde.
** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.