O rap nacional está andando legal por estes dias, hein? Depois do Don L e da Stefanie, mais dois nomes chamam atenção pela ousadia: Joca e Marabu. De forma bem diversas, um com um álbum e outro com um EP conceitual, eles dão prova de que nem sempre tudo já foi feito em matéria de música. E isso é muito bom. Dois trabalhos apaixonantes, viu? E o Do Prado traz o interior e a MPB para esta conversa da semana.
Ninguém nomeia uma faixa como “BADU & 3000” inocentemente. Ao fazer referência a Erykah Badu e Andre 3000, Joca entrega muito mais que um dueto com Ebony, uma love song onde querem ser o casal mais quente do hip hop, igual Badu e 3000. Ao citar o casal, Joca também informa suas ambições. Estamos falando de dois artistas imensos, atentos a sua obra, lançando novidades sempre a conta gotas, com cuidado e esmero. Joca vai por esse caminho. “CORTAVENTO” vem seis anos depois de sua estreia, o já cult “A Salvação É pelo Risco: o Show do Joca”, trabalho bem menos ouvido do que merece. É um tempo enorme de espera para um artista jovem, todos pressionados a produzir. Mas, ao desrespeitar o tempo do mercado, o artista mineiro crescido em Niterói lembra os ídolos e faz valer a espera. “CORTAVENTO” não tem aresta, fio solto, correria ou parte malfeita. Os beats e letra estão em casamento, Joca respeita sua pesquisa musical diversa nas batidas ao escrever e vice-versa. Os temas são muitos: amor, sexo, rua, religião, sonho, desejo. Os ritmos também: “Da linguagem eletrônica contemporânea rumo às batucadas de terreiro, mostrando que tudo isso está conectado”, escreve Joca. Uma prova de sua conexão com o real: o volume de amigos do próprio rapper compartilhando suas impressões sobre o disco nas redes sociais. Impressões honestas, emocionadas, longe de serem mera “divulgação”. É sobre paixão. Paixão pela vida, de gente interessada, na busca por algo.
No EP “Lili”, o rapper Marabu faz uma pequena obra conceitual sobre liberdade guiada por piano constante que atravessa as três canções do trabalho. A cada canção, as letras desafiam as prisões da vida, da cadeia à segregação geográfica (“Eles voltarão a ter medo do Haiti”), enquanto a musicalidade do disco também vai ganhando vida ao se soltar das correntes. O piano minimalista do começo começa a dançar, a percussão aparece e a mensagem de Marabu ganha força ao ser expressa de forma tão complexa e rica. “Rubato”, nome da faixa de abertura e esta de destaque aqui, é um termo da música para indicar quando o músico “rouba” o tempo de algumas notas. Nesse “roubo” que se dá personalidade em uma interpretação. Pense na voz e no violão do João Gilberto, por exemplo. Marabu usa o rubato em música e verso aqui, se apropriando de volta das notas, da cultura, dos lugares, de tudo que lhe foi tomado à força. Daí ser uma sacada e tanto usar um termo mais associado à música clássica em um som cheio de funk, ambos os gêneros cheio de “rubatos”, mas tão separados por classicismo. “Essa é pra todos vocês que prezam pela liberdade do ser, pensar e agir”, escreveu o rapper em seu Instagram. É por aí.
Artista de Americana, interior de São Paulo, DO PRADO chega ao seu primeiro álbum, “Quantas Vezes É Possível se Apaixonar?” com uma consciência boa do que quer fazer após dez anos de estrada. Atento ao pop mais mainstream e também aos nomes mais alternativos da CENA brasileira, ele conta estar atrás de um intervalo perfeito entre as duas coisas. Nessa busca, salta aos ouvidos o esmero da produção do álbum gravado entre Minas Gerais e São Paulo. Tá pronto para o rádio, só falta as rádios estarem prontas para DO PRADO. E terem mais carinho com vozes que não dizem as mesmas coisas de sempre.
O Berlim do Pará já nos conquistou pelo nome, lógico. Era um sonho nosso ter uma banda chamada Berlim do Pará, pô. E aqui está ela nas mãos de Marisa e Fernando Feitosa. A formação do nome foi bem prática, aliás. Ela é do Pará e ele é um brasileiro em Berlim. Mesmo à distância, o relacionamento musical deles deu match. Na preparação do álbum de estreia, andam soltando singles ao pouquinhos, como esta melancólica e nublada “Dias por Ardor”.
Por falar em bons nomes artísticos, é de se pensar como um apresentador de auditório anunciaria a AMANDONA!. A exclamação no nome entrega de cara sua intensidade, sua vontade de agarrar a vida. O seu álbum de estreia se chama “Se Eu Pudesse Te Beijava até a Voz” não por acaso. Vale prestar atenção também na produção de Luiza Brina, sutilmente ampliando aqui ideias que já vimos em álbuns seus, como se criasse um multiverso da Brina. Interessante demais.
Seria muito caído para uma banda como o Crizin da Z.O. lançar uma versão “deluxe” de um álbum. Leitores da realidade como poucos, eles sabem o que pega no mundão. Daí que o excelente “Acelero”, lançado ano passado, ganha um “pacote de expansão” em “ACLR+6”, pequena coleção de seis inéditas que “não ocupam um lugar de sobra, mas são uma extensão do universo já criado”, diz Cris Onofre, ⅓ do trio. No diagnóstico da crise, olhando para os que não se dobram a ela, versos como o de Edgar (“Eu gosto da Bjork/ Mas prefiro a Juçara”) ganham os corações de quem sabe onde está a resposta para tanto mal.
Em mais um single de sua nova fase, voltando ao mundo independente, Mahmundi parece ter escrito uma música perfeita para ser trilha sonora entre o aeroporto de Salvador e o centro da cidade, do asfalto até o mar. Uma faixa tão leve e gostosa e rara quanto uma brisa capaz de mudar o humor do dia. Nosso privilégio é ela compartilhar seu feeling com a gente. Uma ação de marketing perfeita para o single seria vir junto uma passagem para Bahia.
Paulistanos hoje podem relembrar os dias da locadora 2001 quando adentram o catálogo virtual do Mubi – o espacinho do cinema cult na era do streaming. É de lá que YMA retalha títulos e cola eles em uma disposição quase aleatória, “deixando o inconsciente conduzir”, mas permitindo múltiplas interpretações – David Lynch, devidamente citado com “Eraserhead”, aprovaria. O single “2001”, este aqui, é a primeira mostra do seu próximo álbum, “Sentimental Palace”, previsto para setembro.
No filme “Homem com H”, uma das cenas mais emocionantes é quando a voz de Ney Matogrosso encanta o coral madrigal do qual faz parte, antecipando o que seria sua marcante presença. Nela, Jesuíta Barbosa, o ator que interpreta Ney, é dublado pelo próprio Ney. A música chega às plataformas de streaming através do EP “Homem com H”, que ainda traz outros três registros na produção caprichosa dos irmãos Amabis – Gui, Rica e Mariana.
A dupla mineira Ogoin e Linguini gosta de trabalhar em conceitos diferentões para seus trabalhos. Se a primeira mixtape, “Ogoin e Linguini: TV Show”, era uma sitcom, “Coletânea Good Times” é uma… coletânea. Mas de inéditas, ou seja, um falso greatest hits focado em canções de amor. De quebra, acaba sendo uma coletânea de verdade ao recuperar o maior hit deles, “Good Times”, sumida dos streamings por uns tempo por conta de questões de direitos autorais.
11 – Rico Dalasam – “Dilema” (6)
12 – Mateus Fazeno Rock – “Melô do Sossego” (7)
13 – Walfredo em Busca da Simbiose – “Iridescência” (8)
14 – Clara Lima – “PHD” (9)
15 – Juvi – “Tomara Que Tu Não Seja Minha Prima” (10)
16 – Don L – “Iminência Parda” (11)
17 – Lupe de Lupe – “Vermelho (Seus Olhos Brilhanto Violentamente Sob os Meus)” (12)
18 – Joyce Moreno – “Um Abraço no João” (com Jards Macalé) (14)
19 – Bersote – “Desceu Amargo” (17)
20 – Luedji Luna – “Bonita” (com Alaíde Costa e Kato Change) (18)
21 – Lau e Eu – “Coivara do Sono…” (19)
22 – Marrakesh – “Cão” (20)
23 – Joaquim – “Emboscada” (21)
24 – Alberto Continentino – “Cerne” (22)
25 – Zé Ibarra – “Segredo” (23)
26 – Jadsa – “Samba pra Juçara” (25)
27 – eliminadorzinho – “A Cidade É uma Selva” (26)
28 – Gab Ferreira – “Ponta da Língua” (27)
29 – Mateus Aleluia – “No Amor Não Mando” (28)
30 – Alaíde Costa – “Bandeira Branca” (com Amaro Freitas) (29)
31 – Antropoceno – “Queda do Céu” (30)
32 – Eduardo Manso – “FRB 20220610A” (32)
33 – clara bicho – “Meu Quarto” (33)
34 – Stefanie – “Fugir Não Adianta” (com Mahmundi) (34)
35 – Maré Tardia – “Ian Curtis” (35)
36 – Vera Fischer Era Clubber – “Lololove U” (36)
37 – Josyara – “Eu Gosto Assim” (37)
38 – Rachael Reis – “Jorge Ben” (38)
39 – Rael – “Onda (Citação A Onda) (com Mano Brown e Dom Filó) (39)
40 – Cajupitanga e Arthus Fochi – “Flamengo” (40)
41 – Djonga – “Demoro a Dormir” (com Milton Nascimento) (41)
42 – Jovens Ateus – “Mágoas – Dirty Mix + Slowed Reverb” (42)
43 – Bufo Borealis – “Urca” (43)
44 – Terraplana – “Todo Dia” (44)
45 – Apeles – “Mandrião (Vida e Obra)” (45)
46 – ÀIYÉ e Juan De Vitrola – “De Nuevo Saudade” (46)
47 – Dadá Joãozinho – “As Coisas” (com Jadidi) (47)
48 – Gabriel Ventura – “Fogos” (48)
49 – Nyron Higor – “São Só Palavras” (49)
50 – BK – “Só Quero Ver” (50)
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* Entre parênteses está a colocação da música na semana anterior. Ou aviso de nova entrada no Top 50.
** Na vinheta do Top 50, o rapper mineiro Joca.
*** Este ranking é pensado e editado por Lúcio Ribeiro e Vinícius Felix.