Hayley Williams vai de Arcade Fire a Olivia Rodrigo em novo álbum, lançado dentro de uma tinta de cabelo 

Há duas semanas, no dia 28 de agosto, a cantora Hayley Williams, mais conhecida por ser a cara da banda de emo-pop-punk Paramore, apresentou seu terceiro disco solo, que aponta para várias direções que nos interessam, como nos conta, abaixo, a colaboradora Mariana Perizzolo.

O lançamento desse disco sozinho e de capa que traz o rosto dela não muito satisfeita com a vida causou um reboliço danado na internet, porque os fãs dela e principalmente do Paramore acharam ele um indicativo do fim do grupo.

Enquanto pondera que a banda só está dando um tempo, Williams parece mais interessada no momento em trabalhar esse elogiadíssimo disco solo e vender produtos de sua marca de tintura de cabelo. Ou, neste caso, as duas coisas juntas, como nos fala a Mariana.

Após o lançamento do aguardado Ego Death At A Bachelorette PartyHayley Williams precisou lidar com uma onda de especulações que tomou conta das redes sociais: estaria o Paramore chegando ao fim? O boato ganhou força após o rompimento da cantora com o guitarrista Taylor York, parceiro de longa data dentro e fora dos palcos.

No fim de julho, Hayley Williams, vocalista do Paramore, lançou 17 singles-surpresa do seu mais recente projeto solo. Em agosto, ela apresentou um álbum completo, composto pelas 17 faixas mais a que promete ser um dos hits da sua nova fase. 

Livre de um contrato de 20 anos com a Atlantic Records e também comemorando 20 anos do seu álbum de estreia no Paramore, em 2025, uma das maiores frontwomen do mundo mostra que tem muito a dizer e vários caminhos a seguir. Mas seu novo álbum solo, “Ego Death at a Bachelorette Party”, é a redenção com todos os fãs que ainda ressentem qualquer tipo de desencontro.

Seu público já não é mais formado apenas pelos fãs da sua música, tanto que a experiência inicial do novo álbum foi concebida para quem comprasse algum item da sua marca de tintas para cabelo, a Good Dye Young.

No dia do lançamento, quem adquiriu algum de seus produtos recebeu por e-mail um código que levava para um site retrô onde as 18 novas músicas estavam disponíveis, fora das plataformas de streaming e redes sociais.

Para a indústria, o novo projeto da cantora e “girl boss” atendeu ao critério de excelência pelo qual, segundo alguns críticos, uma obra deve cumprir pelo menos dois dos seguintes parâmetros: aspirar à genialidade, camuflar-se de atitude e estar inserida em um movimento geocultural. Mas da perspectiva puramente musical, “Ego Death at a Bachelorette Party” atende a esses critérios?

Apesar de já estar viralizando no TikTok mesmo tendo evitado os algoritmos, Hayley Williams teve um bom intervalo para fazer exatamente o que queria neste seu primeiríssimo lançamento como artista solo independente: conversar e estar próxima somente das pessoas que realmente desejava.

“Ego Death” propiciou uma conversa intimista em que, além do tom confessional já apresentado nos álbuns solo anteriores, fica evidente que a vocalista do Paramore tem em comum com o seu público um repertório consolidado de pop, rock e indie. Aqui, ela o evoca para compor o seu trabalho mais experimental. 

De um lançamento que celebra a liberdade não se poderia esperar unidade estética. Por isso, Hayley se veste e se despe de várias máscaras, transitando entre linhas que vão da estranheza cósmica do Arcade Fire até momentos de pop cintilante de Olivia Rodrigo.

Desses extremos, explora nuances açucaradas como no refrão de “Parachute”, faixa que fecha o álbum e que ecoa o mesmo apelo distante da voz de Régine Chassagne em “Sprawl II”. E a suposta dívida que a intérprete de “Good 4 U” tinha com a vocalista em relação a “Misery Business”, do Paramore, pode se dar por quitada, pois agora é Hayley quem se apropria de uma progressão de “Jealousy Jealousy” no pré-refrão de “Dream Girl in Shibuya”.

A habilidade em transitar por universos tão distintos soa própria de alguém capaz de se comunicar em diversos planetas, mas se sentir deslocada em todos eles. Essa estranheza familiar se faz mais presente em alguns momentos, como em “Brotherly Hate”, em que guitarras cósmicas expressam a sensação de não-pertencimento, não como vulnerabilidade mas sim como empoderamento. Em “Negative Self Talk” é possível sentir essa mesma energia em uma espécie de transe.

Inclusive, ao explorar sua relação com o feminino, Hayley se mostra mais política do que em qualquer trabalho anterior, incluindo o incisivo “This Is Why”, último álbum do Paramore. Em “Kill Me”, ela aborda fardos específicos de “filhas mais velhas”, pisando descalça sobre traumas que atravessam vidas de mulheres por gerações.

Nesse delicado exercício, usa o tom de “Crystalised”, hino do XX. O trio britânico, que teve seu auge nos anos 2010, usava timbres sombrios do indie para dar novas roupagens às temáticas de suas letras, o que construiu sua identidade como uma banda musicalmente sofisticada embora muito jovem. 

Hayley, contudo, já é uma voz experiente, mas que ainda mantém a atitude enérgica desde sua estreia em “All We Know Is Falling”, primeiro álbum do Paramore. Mas, por um lado, manteve o frescor dos primeiros singles. As certezas daquela época se esvaneceram. Em “Glum”, inclusive, questiona se é normal não saber “o que está fazendo aqui”, a caminho dos 37 anos.

Capa de “Ego Death at a Bachelorette Party”, o novo disco solo da da Hayley Williams

Como todo adulto que assume a própria excentricidade, o álbum não poderia deixar de ter um aceno ao Radiohead, que fica a cargo da belíssima “Blood Bross”. Eis a oportunidade para Hayley provar definitivamente sua versatilidade: depois de ter participado da turnê da Taylor Swift com o Paramore, ela poderia abrir para o Radiohead na turnê de 2026. Que tal?

Em seu melhor e mais eloquente trabalho solo, Hayley Williams poderia ter deixado mais espaços para sua estranheza. Mas a linguagem mais pop e afável que entremeia o álbum parece uma atitude poética em dizer a mais pessoas (ou ouvir delas) que ser estranho e vulnerável é normal, assim como escrever uma canção para um antidepressivo e estar perdida aos 36.

Afinal, tanto para a indústria quanto para a arte, “Ego Death at a Bachelorette Party” cumpre os parâmetros de excelência. Mas, embora tudo tenha sido uma surpresa, o fato de Hayley Williams lançar um álbum dentro de uma tintura de cabelo não é exatamente algo que jamais se imaginaria.

***
* Mariana Perizzolo é pessoa que veste preto e tem gato laranja, é estrategista de conteúdo para marcas, aluna do doutorado em Literatura Comparada da USP e escreve sobre cinema, TV, teatro e música para grandes portais. 

MDE 1 – horizontal miolo página
terrenoestranho-greenday-horizontal interna